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terça-feira, 19 de maio de 2015

EVANGELHO DE PENTECOSTES - ANO B - Jo 20, 19-23


COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DA SOLENIDADE DE PENTECOSTES
II - PENTECOSTES NO SÉCULO XXI
Como criaturas humanas que somos, habituados às coisas sensíveis, ou seja, ao que vemos, ouvimos ou apalpamos, vivemos muito mais voltados para a matéria do que propriamente para o espírito; por isso tendemos a crer apenas naquilo que é concreto, como o Apóstolo São Tomé que, ao receber a notícia da Ressurreição de Nosso Senhor, disse: “Se não vir nas suas mãos o sinal dos pregos, e não puser o meu dedo no lugar dos pregos, e não introduzir a minha mão no seu lado, não acreditarei!” (Jo 20, 25). Assim somos nós: queremos comprovar para acreditar. Esquecemos, todavia, que uma vez demonstrado um fato, a razão conclui ante as evidências e torna-se desnecessária a crença; pelo contrário, a fé é justamente uma virtude que nos leva a aceitar aquilo que ultrapassa a nossa constatação, segundo lemos na Escritura: “A fé é [...] uma certeza a respeito do que não se vê” (Hb 11, 1).
Deus é todo-poderoso
Custa-nos, neste sentido, compenetrarmos-nos de um ponto, que é o da onipotência de Deus, embora sempre proclamemos no início do Credo: “Creio em Deus Pai todo-poderoso”. Até os Apóstolos se defrontavam com esta dificuldade, como se infere daquela passagem do Evangelho na qual, tendo o moço rico resolvido conservar seus bens e não seguir o Mestre, Ele disse: “E mais fácil passar o camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus” (Lc 18, 25). Surpresos, os discípulos perguntaram: “Quem então poderá salvar-se?’. Respondeu Jesus: ‘O que é impossível aos homens é possível a Deus” (Lc 18, 26-27).
Devemos, portanto, colocarmo-nos diante desta perspectiva: Deus é todo-poderoso! Ele tirou do nada o universo, uma multidão de criaturas! Se, por exemplo, temos oportunidade de observar as formiguinhas que se preparam para o inverno, levando folhas e alimento para o formigueiro, tomamos isto com naturalidade e não refletimos que é o Criador quem as sustenta, bem como a todos os demais seres: pedregulhos, árvores, insetos.., tudo! Nós mesmos existimos, estamos cheios de vitalidade e somos capazes de ler este texto, porque Deus mantém a cada um.
Com seu poder absoluto Ele formou um boneco de barro que artista nenhum conseguiria imitar; depois, soprou-lhe nas narinas e a figura adquiriu vida (cf. Gn 2, 7), gozando de inteligência, vontade e sensibilidade, num corpo perfeito. Mais ainda, além de ser dotado de uma alma espiritual, o homem possuía o estado de graça, com todos os dons sobrenaturais acrescidos dos preternaturais, como o dom de integridade, que o impedia de apetecer o mal, a não ser que “se rompesse previamente a harmonia resultante da sujeição de sua razão superior a Deus”;4 o dom de imortalidade, mediante o qual não morreria, mas passaria desta vida para a outra, no Céu, sem a dolorosa separação da alma e do corpo; o dom de ciência infusa que, na qualidade de rei da criação, lhe conferia o conhecimento de todas as coisas e das razões pelas quais Deus as fez. Quando os animais se enfileiraram diante de Adão para que lhes desse nome (cf. Gn 2, 19-20), ele os designou com o título correspondente àquilo que compreendia da essência de cada um: leão, tigre, avestruz, formiga... Todas estas maravilhas o primeiro homem as recebeu através de um sopro divino! Por quê? Porque Deus é todo-poderoso!
Um plano manchado pelo pecado
Não obstante, o plano concebido por Deus, ao dar a existência ao homem, foi desfeito pelo pecado. Em consequência, Adão perdeu o dom de integridade, a imortalidade, a ciência infusa e... sobretudo, a graça! A partir dele toda a sua posteridade nasceu com a mancha da culpa original e se foi multiplicando uma descendência, com algumas exceções, terrivelmente criminosa. Sobreveio o dilúvio, a Torre de Babel, e horrores sem conta acumularam-se ao longo de milênios de História, em que a decadência se fazia sentir a cada passo. Por fim, na plenitude dos tempos, a humanidade foi redimida pelo Sangue preciosíssimo de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas, apesar desta restauração, as gerações que se sucederam após a vinda do Messias, em sua maioria, voltaram as costas para os méritos infinitos da Paixão e afundaram novamente no vício; “o mundo não O reconheceu. Veio para o que era seu, mas os seus não O receberam” (Jo 1, 10-11). A própria natureza humana vai se deteriorando: enquanto no Antigo Testamento as pessoas possuíam uma grande resistência física, que lhes permitia viver centenas de anos — como aconteceu a nossos pais, Adão e Eva, ou a Matusalém (cf. Gn 5, 5.27) —, no presente, a expectativa de vida do homem está entre 70 e 75 anos.

Além disso, a força de vontade e a constituição psíquica sofreram significativa degradação. Na sociedade antiga, muito mais orgânica que a de hoje, o equilíbrio nervoso e mental era mantido com mais firmeza; em nossos tempos, em meio à agitação da vida, diminuiu a estabilidade. Em síntese, a virtude vai desaparecendo da face da Terra, o belo está se despedindo do gênero humano. Assim, encontramo-nos numa situação dramática, talvez pior do que quando o Verbo Se encarnou para pregar o Evangelho e morrer na Cruz.
Continua no próximo post

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