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quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Santa Maria Madalena- Uma pecadora que admirava a virtude

As mesas de refeição daqueles tempos costumavam-ser em forma de um longo “u”. O anfitrião e o principal convidado sentavam-se lado a lado, bem ao centro.
Nessas ocasiões, as mulheres eram excluídas dos salões. Portanto, a entrada de uma dama naquele recinto, mesmo sendo de alta reputação, chocaria fortemente todos os comensais; mais ainda se fosse ela conhecida por seus maus costumes. Foi o que se passou.
Há muito que Maria Madalena havia provado o vazio e a mentira do pecado. Sua alma delicada, ansiava uma oportunidade para mudar de vida, mas as circunstâncias a impediam de realizar esse bom intento. Por pura fraqueza caíra naqueles horrores. Mas, em seu coração feminino, guardava uma grande admiração pela virtude e — por incrível que pareça — em especial pela pureza. Sua sensibilidade física a arrastava às enganosas delícias da carne e, portanto, à ofensa grave a Deus; mas a espiritual a convidava à paz de consciência, ao amor ao Criador.
No auge desse dilema, depois de muito implorar socorro ao Céu, ouviu falar do surgimento de um grande profeta em Israel, taumaturgo em altíssimo grau: os paralíticos andavam, os cegos enxergavam, os surdos ouviam, os mudos falavam e até os mortos ressuscitavam. Afinal, pensou ela, chegara o remédio para todos os males que atormentavam seu espírito tão carregado de recriminadoras aflições. Ela se considerava monstruosa e não via a hora em que pudesse sentir-se purificada de suas manchas. Por debaixo daquela lama imunda havia uma pele de arminho que ardia de anseios de limpeza.
As primeiríssimas reacções de sua alma em relação a Jesus foram da mais entranhada simpatia. Desde o início, ela O amou mais do que a si própria e anelava pela oportunidade de se aproximar d’Ele. Assim, “quando soube que estava à mesa em casa do fariseu”, decidiu enfrentar os rigorismos sociais e entrar na sala da ceia. Para chegar onde estava o Divino Mestre, deu a volta pelo lado externo da mesa e “colocando-se a seus pés, por detrás d’Ele, começou a banhar-lhe os pés com lágrimas, e enxugava-os com os cabelos da sua cabeça, beijava-os, e os ungia com o perfume”, que trouxera num frasco de alabastro.
Antes, por sua concupiscência, andava irrequieta a atrair a atenção de todos para si; agora se ajoelha para servir. Os olhos com os quais ofendera a Deus por sua curiosidade irrefreada, choravam de dor pelo passado. Seus cabelos, outrora vaidosamente penteados, ela os utilizava nesse momento como fino linho para enxugar os pés do Senhor. Os lábios que tanto proferiram palavras de insensatez consagravam-se em beijar aqueles divinos pés. Por fim, elevava à categoria de instrumento de louvor o perfume usado em outras eras para açular sua vaidade.
“Assim, esta mulher pecadora tornou-se mais honesta que as virgens, depois de se consagrar à penitência e se dedicar a amar a Deus. E tudo quanto dela se disse, no versículo 38, “Colocando-se a seus pés, por detrás d’Ele, começou a banhar-Lhe os pés com as lágrimas, e enxugava-os com os cabelos da sua cabeça, beijava-os, e ungia-os com o perfume,” passava-se exteriormente, mas o que movia sua intenção, e só Deus via, era muito mais cheio de fervor.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Encontrará fé sobre a Terra

Mas quando vier o Filho do Homem, porventura encontrará fé sobre a terra?
Esta frase causou uma certa dificuldade de interpretação a numerosos exegetas. Alguns afirmam ser a parábola e sua respectiva aplicação referentes aos acontecimentos do fim do mundo.
Em concreto, essa vinda do Filho do Homem tanto poderá significar a parusia (volta gloriosa de Nosso Senhor Jesus Cristo no fim dos tempos), quanto uma notável intervenção d’Ele em benefício de seus eleitos.
Encontrará Ele a fé sobre a terra?
Jesus nos descreve com detalhes os acontecimentos imediatamente próximos ao fim do mundo (Mt 24, 3-51), e nesse seu discurso encontramos elementos a respeito da raridade da fé ao longo dos últimos dias: “Porque se levantarão falsos cristos e falsos profetas, e farão grandes milagres e prodígios, de tal modo que, se fosse possível, até os eleitos seriam enganados” (Mt 24, 24). Conclui-se facilmente ser a fé perseverante desses atribulados fiéis cheios de confiança na bondade de Deus, em sua intervenção e poder. Fé paciente nas adversidades, transbordante de amor a Deus e por isso contínua na súplica, calorosa de esperança em obter logo o que pede.
A essa pergunta feita pelo próprio Jesus: “encontrará fé sobre a terra?”, não nos deixou Ele resposta alguma. Seus ouvintes devem ter saído pensativos à busca de elementos para melhor entender seu significado, e um tanto estimulados a fazerem um exame de consciência. Erroneamente julgaríamos ser essa pergunta dirigida apenas aos circunstantes. Ela nos atinge também a nós, ao lermos o Evangelho de hoje. Se Jesus viesse a nós na época atual, encontraria Ele fé sobre a face da terra?
VIGILÂNCIA E ORAÇÃO
Constituía um verdadeiro sonho, para todo judeu, a implantação de um reino messiânico, de caráter político, sobre a terra. O anseio constante dos israelitas era o de ver seu povo dominando sobre as outras nações. Os próprios Apóstolos, em ocasiões diversas, procuravam saber do Divino Mestre se não havia chegado a hora para a implantação dessa nova era.
A parábola do juiz e da viúva se insere bem exatamente nas considerações a esse propósito. Nos versículos anteriores (Lc 17, 20-37), Jesus discorre sobre o Reino de Deus estendido a todos os homens pela vinda do Salvador, já presente entre eles. Adverte os circunstantes a respeito de quanto é indispensável estarem prevenidos para o grande dia do Juízo, dado que não se pode saber sua data. Sobre a vigilância, impossível haver melhores conselhos.
Mas só esta não é suficiente: “Vigiai e orai para que não entreis em tentação”, disse Nosso Senhor (Mt 26, 41). Faltava uma palavra de incentivo à oração. Daí a “parábola para mostrar que importa rezar sempre e não cessar de o fazer”.
Esse “sempre” não significa que devemos rezar a cada segundo das vinte e quatro horas do dia, mas torna-se indispensável manter uma continuidade moral, uma incansável frequência na oração. Esse “sempre” pode ser sinônimo de “vida inteira”. “Não cessar de o fazer”, apesar dos atrasos em ser atendido, enfrentando ou não obstáculos, na saúde ou na enfermidade, na consolação ou na aridez.
 Ninguém pode se dispensar da oração.
Não julguemos tratar-se aqui de um simples conselho de Jesus. Não! É um preceito, uma obrigação, ninguém pode se dispensar da oração. E quanto mais se sobe na vida interior, maior será o dever e constância da prece.
“Vigiai e orai”, diz-nos o Divino Mestre, e São Paulo insistirá: “Permanecei vigilantes na oração” (Col 4, 2) e “Orai sem interrupção” (I Tes 5, 17). Nossa própria natureza tisnada pelo pecado exige de nós essa postura face à oração; e, mais ainda, assim nos manda proceder a Santa Igreja, conforme determina o Concílio de Trento: “Deus não manda impossíveis; e ao mandar-nos uma coisa, determina-nos fazer o que podemos e pedir-Lhe o que não podemos, bem como ajuda para poder”.
Por outro lado, o atendimento da parte de Deus será completo. Ele não olha para o tipo de necessidade, nem para a origem ou o tamanho da mesma, pois nada Lhe é impossível. Acontecimentos, ameaças, riscos, homens, demônios, etc., tudo está nas mãos d’Ele e bastará um ínfimo ato de sua vontade para resolver qualquer problema. Porém, não nos esqueçamos de que se quisermos nos lançar contra uma dificuldade, usando exclusivamente de nossos dons naturais e forças, não estará aí engajada a palavra de Deus! É preciso importuná-Lo! Ele assim o exige. Ainda mais, é preciso ser incessante e fazer-Lhe uma espécie de “pressão moral”, sem nos cansarmos.
A contínua oração dos eleitos, em meio às dificuldades clamando a seu Pai, é infalível! Ademais, consideremos a absoluta necessidade da oração, no que diz respeito à salvação eterna, conforme as calorosas palavras de um grande Doutor da Igreja, Santo Afonso Maria de Ligório:
Terminemos este ponto, concluindo, de tudo quanto dissemos, que quem ora certamente se salva e quem não ora por certo será condenado. Todos os bem-aventurados, excepto as crianças, salvaram-se pela oração. Todos os condenados perderam-se por não orarem; se tivessem rezado não se teriam perdido. E este é e será no inferno o maior desespero, poderem ter alcançado a salvação com tanta facilidade quando bastava pedir a Deus as graças necessárias, e agora esses miseráveis não têm tempo de pedir.”
Lembremo-nos do maternal conselho de Maria: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo 2, 5). Com essas palavras, Ela nos confirma ainda mais, ao encerrarmos os comentários ao Evangelho de hoje, o quanto é indispensável rezar sempre. E se quisermos ser atendidos em maior profusão e prontamente, façamo-lo por intermédio de sua poderosa intercessão. Assim, estaremos agradando a Jesus que se tornará ainda mais propício às nossas súplicas.