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sábado, 31 de março de 2012

Manifestação da infinita misericórdia divina

Deus se compadeça de nós e nos abençoe. Faça resplandecer sobre nós a luz de sua face e tenha piedade de nós. Senhor, nós adoramos a vossa cruz.

A beleza dessas frases está em que os Impropérios poderiam nos causar atitude de alma quase de liquidação, de prostração, porém a liturgia nos lembra o contrário. Deus é a fonte de todas as misericórdias. Daí o reiterado pedido: Tenha piedade de nós!

Nosso Senhor se compadece de nós, mas deseja receber a nossa súplica nesse sentido. O Redentor nos salvará se soubermos recorrer a Ele por meio das lágrimas e preces de Nossa Senhora, Medianeira Universal. Portanto, tenhamos coragem, confiança e ânimo.

Em determinado momento, receberei uma graça tão insigne que serei limpo de meus pecados e defeitos espirituais. Donde a beleza do pedido: “Deus faça resplandecer sobre nós a sua face”, exprimindo o fato de que Deus, ao se alegrar com os homens, volta sua face para eles e tudo se torna fácil, suave, brilhante. Pelo contrário, nas épocas de castigo, o Altíssimo desvia seu rosto e não olha para os homens, como se o sol desaparecesse...

Nosso Senhor Jesus Cristo volta para nós sua face divina — não mais com aquele aspecto sublime e sob certo ângulo um tanto terrificante do Santo Sudário — com semblante de misericórdia, com bondade e perdão, como fitou São Pedro. E neste momento, em que também o rosto de Nossa Senhora se dirige para nós, a graça nos ilumina, sentimos piedade, devoção, como que ressurgimos e nossa vida espiritual ganha novo impulso.

sexta-feira, 30 de março de 2012

"Faça-se a vossa vontade e não a minha"

“Meu Pai, se é possível, afaste-se de Mim este cálice. Todavia, faça-se a vossa vontade e não a minha.”


Cada homem deve carregar sua cruz

Jesus quis que os homens vissem todo o sofrimento d’Ele, para que cada um de nós tivesse a coragem de carregar o seu próprio sofrimento. Se o Homem-Deus passasse pela Terra e sofresse um pouquinho, derramando uma gotinha de sangue, remidos estávamos.

Mas faltaria a lição de conformidade com a dor, de aceitação do sofrimento como sendo a mais alta coisa da vida — não um desastre, um trambolho, algo que não se compreende e não deveria ter sucedido —, o caminho necessário para que o homem chegue até onde deve chegar, a estrada para a qual ele se dirige como sendo a realização de seu próprio destino.

Quer dizer, cada um de nós nasceu para carregar uma cruz, passar por um horto das oliveiras, beber um cálice, ter as suas horas de agonia e em que diz a Deus Nosso Senhor: “Meu Pai, se possível, afastai de mim este cálice, mas faça-se a vossa vontade e não a minha.”

A idéia de que o homem nasceu para dar glória a Deus, antes de tudo sofrendo, esta idéia retriz, fundamental na formação do verdadeiro católico, não a teríamos se não fosse apresentada pelo mais sublime e arrebatador dos exemplos, que é Nosso Senhor Jesus Cristo morrendo na Cruz.

Vemos aqui um contraste com o espírito moderno, segundo o qual a finalidade do homem na Terra é ter êxito, saúde, enriquecer, gozar a vida e morrer bem tarde, quando não mais houver remédio. E, durante toda a existência, ter a maior quota possível de segurança, de maneira tal que, não digo o sofrimento, mas o medo do sofrimento, não o assalte. Tal visualização é pagã por essência. Calcular a vida assim é calculá-la à maneira de um pagão. A formação católica prepara as pessoas para o sofrimento, pois está fundamentada em Nosso Senhor Jesus Cristo, cuja vida foi centrada nesta hora suprema da dor.

Como consideramos os sofrimentos de nossa vida?

Isto nos leva a perguntar como consideramos os sofrimentos de nossa vida, dos quais o maior, sem dúvida nenhuma, é a nossa própria santificação. Toda santificação séria faz sofrer, e sofrer muito. E se alguém me disser que não sofre, eu teria vontade de perguntar-lhe, de imediato: “Então tu não te santificas?” Porque não há santificação que não venha acompanhada de dor.

Visando nossa santificação, devemos fazer perguntas como as seguintes:

Combatemos os maus impulsos que, em consequência do pecado original e das nossas más ações, existem dentro de nós? Como fazemos, não só para reprimir os maus impulsos, mas para praticar as virtudes que lhes são opostas? Aceitamos as nossas limitações de inteligência, físicas de toda ordem, sociais, tais como: falta de posição, de fortuna, de atrativos? Há pessoas sem graça, com as quais os outros não gostam de ter relações; passam diante delas e, quando muito, as cumprimentam. Existem também as muito engraçadas, procuradas por todo o mundo para se divertirem com elas, e que nos solicitam à palhaçada. Como aceitamos a necessidade de resistir a essa solicitação?

Para tudo isto, cada um tem a sua cruz. E Nosso Senhor Jesus Cristo nos mostra o papel fundamental do sofrimento. Uma das razões pelas quais não foi possível ao Padre Eterno atender à oração de Jesus foi que os homens tivessem esse exemplo.

quinta-feira, 29 de março de 2012

“Deus é amor”

Um insuperável clímax de plenitude de amor atinge o Sagrado Coração de Jesus naquelas últimas horas de convívio com os Seus. Transcorrem ali, naquele histórico recinto, os momentos finais de Sua vida terrena. São os derradeiros episódios que constituem o grande pórtico dos sagrados mistérios da Redenção prestes a realizarem-se. Os inimigos se agitam e se entre-estimulam a perpetrar o mais grave homicídio de todos os tempos. Encontram-se eles na dependência de um guia possuído por Satanás, aguardando o momento propício para agarrar o Messias e conduzi-Lo aos tormentos da Cruz. Não há minuto a perder, é indispensável o Salvador externar ao Pai e aos discípulos o transbordante amor a borbulhar no interior de Seu Sagrado Peito.

As primeiras manifestações desse amor já haviam se dado na própria obra da Criação. Desfrutando de perfeita felicidade em Si mesmo, desde toda a eternidade, não necessitava Deus de nenhum ser que O completasse. Entretanto, por amor, quis Ele comunicar Suas infinitas perfeições às criaturas, de maneira que estas Lhe rendessem a glória extrínseca. Com especial benevolência, concebeu os Anjos e os homens à Sua imagem, destinando-os a participar da vida e da natureza divinas, pela Graça. E eles, seres racionais, encontram sua felicidade em glorificar seu Criador, pois “o mundo foi criado para a Glória de Deus”.

A Criação foi, portanto, o início ad extra da demonstração de Seu amor divino. “Se Deus produziu as criaturas — afirma São Tomás — não é porque delas necessite, nem por nenhuma outra causa exterior, mas por amor de sua bondade”. E Royo Marín, citando Chaine, acrescenta: “O amor é o atributo que melhor nos dá a conhecer a natureza de Deus [...]. É de tal maneira representativo, que São João não o considera como atributo, mas como a expressão da própria natureza de Deus”.

Deus caritas est (I Jo 4, 16), e “na história de amor que a Bíblia nos narra — ensina Bento XVI na encíclica assim intitulada — Ele vem ao nosso encontro, procura atrair-nos, chegando até a Última Ceia, até o Coração trespassado na Cruz, até as aparições do Ressuscitado e as grandes obras pelas quais Ele, através da ação dos Apóstolos, guiou o caminho da Igreja nascente”.

Eis algumas considerações que nos levam a ver no Cenáculo, um símbolo e lição da perfeita Caridade. Na Antiga Lei, o amor não era universal. Limitava-se ao benfeitor, ao amigo, ao conacional. Ademais, a medida do amor era, então, o empregado a nós mesmos. A partir de Cristo, trata-se de um mandamento novo, tal qual encontramos na aclamação do Evangelho de hoje: “Amai-vos uns aos outros, como Eu vos tenho amado” (Jo 15, 12).


quarta-feira, 28 de março de 2012

Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo

Meditar na Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo constitui um inestimável exercício de piedade. Ao considerar a infinita paciência do Homem-Deus em suportar as dores mais acerbas e em se imolar pela nossa redenção, nutri nossa própria alma com esse alimento indispensável para a santificação do católico: o amor à cruz, a aceitação do sofrimento.

De modo particular, a tenacidade heróica do Salvador a caminho do Calvário suscita no espírito reflexões pervadidas de adoração ao Divino Modelo, de súplicas, bem como de entranhada compunção da criatura apequenada diante da grandeza do Criador chagado:

“É fácil falar em sofrimento. O difícil é sofrer. Vós o provastes, Senhor. Quando vossa hora chegou, tremestes, Vos perturbastes, suastes sangue diante da perspectiva do sofrimento. E neste dilúvio de apreensões, infelizmente por demais fundadas, está a consagração de vosso heroísmo. Vencestes os brados mais imperiosos, as injunções mais fortes, os pânicos mais atrozes. Tudo se dobrou ante vossa vontade humana e divina. Acima de tudo, pairou vossa determinação inflexível de fazer aquilo para que havíeis sido enviado por vosso Pai. E, quando leváveis vossa Cruz pela rua da amargura, mais uma vez as forças naturais fraquejaram. Caístes, porque não tínheis força. Caístes, mas não Vos deixastes cair senão quando de todo não era possível prosseguir no caminho. Caístes, mas não recuastes. Caístes, mas não abandonastes a Cruz. Vós a conservastes convosco, como a expressão visível e tangível de vosso propósito de a levar ao alto do Gólgota.

“[E] caístes mais uma vez, Divino Senhor. Como é duro o caminho da Cruz! Foi duríssimo para Vós. Será também duríssimo para vossos seguidores. Há momentos em que os caminhos parecem todos fechados para nós, o céu se tolda, as esperanças desaparecem, as apreensões povoam de negros fantasmas a nossa imaginação. As forças começam a fraquejar. Não podemos mais. Embora caiamos debaixo da cruz, meu Deus, mais uma vez Vos suplicamos, por vossas entranhas misericordiosas, pelo vosso Coração Sagrado, pelo amor que tínheis à vossa Mãe, não permitais que saiamos da estrada do sofrimento e da virtude, e que atiremos para longe de nós a cruz. Socorrei-nos então, Senhor meu de misericórdia. Porque o que queremos é o cumprimento inteiro de nosso dever.

“Mas ouvi, Deus benigno, a súplica de nossa fraqueza. Quantos amigos tendes, que Vos aconselhariam a renunciar quando caístes da primeira vez? Da segunda vez, seriam legião. E vendo-Vos cair pela terceira, quantos Vos não abandonariam escandalizados, achando que éreis temerário, falto de bom senso, que queríeis violar os manifestos desígnios de Deus?! Que esses passos de vossa Paixão nos dêem graças, Senhor, para sermos de uma invencível constância no bem, conhecendo perfeitamente o caminho do verdadeiro heroísmo, que pode chegar a seus limites mais extremos e mais sublimes sem jamais se confundir com uma vil e presunçosa temeridade”

terça-feira, 27 de março de 2012

Também nós devemos estar dispostos a fazer o papel de servo

 “Jesus sabia quem O ia entregar; por isso disse: ‘Nem todos estais limpos’”.

Está claramente afirmado neste versículo que todos, menos um, estavam na graça de Deus. Um ali era traidor, mas, mesmo a este, Jesus estava disposto a perdoar! Daí esta insinuação, que era, como bem a propósito sublinha o padre Truyols, “uma delicada alusão a Judas, um último convite do Bom Pastor à ovelha desgarrada”. Se, naquele momento, ele tivesse tido pelo menos um movimento de alma de arrependimento, e pedido interiormente perdão, sua história teria sido outra. “Como, porém, estava já muito endurecido no mal, permaneceu insensível à advertência”, observa Fillion.

Desde toda a eternidade tinha visto Nosso Senhor essa recusa de Judas, e naquele momento estava comprovando-a enquanto homem. Pelo discernimento dos espíritos, que possuía em sumo grau, penetrava na alma do traidor e via aquela determinação horrorosa. Apesar disso, ajoelhou-Se diante dele e lavou-lhe os pés.

Jesus nos deu essa lição para compreendermos quanto Ele nos ama e até que ponto deseja perdoar a todos e a cada um. Mas também para nos ensinar a suportar todas as misérias, dificuldades e contratempos causados pelo convívio humano. Comenta, com muito senso psicológico, São Bernardo: “Vós talvez enrubesceríeis por imitar a humildade de um homem; imitai pelo menos a humildade de um Deus, pois aqui está o que torna a humildade tão recomendável”.

Por mais que possamos encontrar dificuldades temperamentais ou inconveniências no relacionamento com os outros, devemos imitar Jesus, tratando cada um de nossos irmãos como Ele tratou Judas no lava-pés.

As relações humanas podem ser, no princípio, repletas de alegria e de suavidade, mas logo depois costumam aparecer os percalços, as rusgas, as dificuldades. São as contingências deste vale de lágrimas. Nesses momentos, devemos lembrar-nos da Santa Ceia, estando dispostos a fazer o papel de servo uns em relação aos outros, a perdoar o irmão a ponto de esquecer qualquer desgosto que nos tenha dado; em suma, a estimá-lo como se víssemos nele a própria figura de Jesus.