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quarta-feira, 1 de outubro de 2014

EVANGELHO – XXVII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - Mt 21, 33-43

CONCLUSÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – 27º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A
III - NÓS TAMBÉM SOMOS VINHA DO SENHOR
Os comentários sobre este Evangelho ficariam incompletos se limitássemos a sua aplicação àqueles que planejaram a morte de Cristo, ou mesmo à humanidade em seu conjunto. Na parábola dos vinhateiros homicidas cumpre encontrarmos uma lição para cada um de nós, pois as palavras de Nosso Senhor ecoam para os homens de todas as épocas históricas. Com efeito, a vinha de que fala a Liturgia pode ser considerada a alma de todo católico, a quem Deus ama com predileção, a ponto de lhe dirigir a pergunta: “O que poderia Eu ter feito a mais por minha vinha e não fiz?”.
Os dotes que recebemos, desde o ser, a inteligência, a vontade, a sensibilidade, a vocação específica, tudo nos é entregue pelo Senhor da vinha. Dentre estes favores, nenhum é digno de maior apreço que a vida divina, como ensina São Rábano Mauro: “Em sentido moral, a cada um se entrega sua vinha para que a cultive, ao ser-lhe administrado o Sacramento do Batismo, a fim de que trabalhe por meio dele. E-lhe enviado um servo, outro e um terceiro, quando a Lei, o Salmo e a profecia falam, e em virtude de cujos ensinamentos deve-se agir bem. Mas o enviado é morto e lançado fora, se despreza a sua pregação ou, o que é pior, se blasfema contra ele. Mata o herdeiro que traz em si todo aquele que ultraja o Filho de Deus e ofende o Espírito de sua graça. Uma vez perdido o mau cultivador, a vinha é entregue a outro, como acontece com o dom da graça, que o soberbo menospreza e o humilde recolhe”.8
Deus vela sempre por nós e, ao longo dos anos, nos trata com muito mais carinho, vigilância e amor do que qualquer vinhateiro no que se refere à sua plantação. Ele vai preparando as circunstâncias, atendendo, colocando anteparos para que os obstáculos não nos façam cair. Em troca, o que espera de nós? Que sejamos uma videira que dê o fruto excelente das obras de perfeição, do qual saia depois o bom vinho da santidade. Por isso virá cobrar os frutos. Cabe-nos trabalhar para produzi-los, conscientes de que tudo quanto possuímos tem sua origem n’Ele. Até mesmo a força para praticar a virtude nos é incutida por Deus, como um dom que nos permite adquirir méritos com vistas à nossa eterna salvação.
Um oportuno exame de consciência
Como cuido, então, desta vinha que sou eu? Zelo por ela com todo o esmero e restituo a Deus o que Lhe pertence? Estou constantemente com a atenção posta nas realidades sobre naturais, com desejo de beneficiar o próximo, compenetrado de que fui chamado a dar glória a Deus e reparar o Sapiencial e Imaculado Coração de Maria dos inúmeros pecados que hoje se cometem? Estou atento à chegada dos empregados do Dono da vinha? Uma palavra dita do púlpito, um conselho de alguém que busca a minha santificação, uma admoestação da consciência... Mais ainda, os rogos de Nossa Senhora e o amparo do meu Anjo da Guarda. O que eu faço a esses empregados? Apedrejo-os, bato neles e os mato, sufocando sua voz? Pois se não quero de modo algum entregar a Deus o que é d’Ele e uso de seus dons para o meu gozo pessoal ou, pior, para ofendê-Lo, estou, no fundo, batendo, apedrejando, matando os empregados, e até o Filho do Divino Dono. E indispensável precaver-me, porque o Reino dos Céus que recebi no dia de meu Batismo poderá ser-me retirado e dado a outros.
Quanta matéria para um exame de consciência! Como me encontro agora? Diante destas palavras, qual é a minha reação? Estou me esquivando, desvio a atenção ou coloco-me diante da obrigação de prestar contas pela vinha que sou eu? Se a consciência me acusar, devo lembrar-me do ensinamento de São Paulo, na segunda leitura: “Não vos inquieteis com coisa alguma, mas apresentai as vossas necessidades a Deus, em orações e súplicas, acompanhadas de ação de graças. E a paz de Deus, que ultrapassa todo o entendimento, guardará os vossos corações e pensamento em Cristo Jesus” (Fi 4, 6-7). Graças à maternal intercessão de Maria Santíssima tudo tem solução, desde que eu reconheça que procedi mal e preciso mudar de vida. Peçamos a Nossa Senhora, então, misericórdia e forças para nos emendarmos e aderirmos com entusiasmo à vontade do Dono da vinha.
1) Cf. GALLEGO, Epifanio. El movimiento profético. Isaías. In: GONZÁLEZ, Angel et al. Comentarios a la Biblia Litúrgica.Antiguo Testamento. 4.ed. Madrid-Barcelona-Estella: Paulinas; PPC; Regina; Verbo Divino, 1990, p.615-616.
2) SÃO JOÃO CRISÓSTOMO. Homilía LXVIII, n.J. In: Obras. Homilías sobre el Evangelio de San Mateo (46-90). 2.ed. Madrid: BAC, 2007, vII, p.387.
3) SÃO JERÔNIMO. Comentario a Mateo. L.III (16,13-22,40), c.21, n.51. In: Obras Completas. Comentario a Mateo y otros escritos. Madrid: BAC, 2002, v.11, p.299.
4) AUTOR INCERTO. Opus imperfectum in Matthæum. Homilia XL, c.21: MG 56, 854.
5) SÃO JERÔNIMO, op. cit., p.299.
6) Idem, p.301.
7) SAO JOAO CRISÓSTOMO, op. cit., n.2, p.390-391.

8) SÃO RÁBANO MAURO. Commentarionim in Matthæum. L.VI, c.21: ML 107, 1053.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

EVANGELHO – XXVII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - Mt 21, 33-43

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – 27º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A
Jesus profetiza o deicídio
“Finalmente, o proprietário enviou-lhes o seu filho, pensando: ‘Ao meu filho eles vão respeitar’. 38 Os vinhateiros, porém, ao verem o filho, disseram entre si: ‘Este é o herdeiro, Vinde, vamos matá-lo e tomar posse da sua herança!’ 39 Então agarraram o filho, jogaram-no para fora da vinha e o mataram”.
Por fim, num extremo de amor, Deus não manda mais um profeta, mas seu Filho querido para convidar os israelitas a serem fiéis à Aliança. No entanto, eles O matam. A parábola neste trecho não poderia ser mais explícita: encontrando-Se próximo à Paixão, não por acaso quis o Divino Mestre deixar bem clara a verdade e fazer uma profecia sobre Si mesmo. Era a ocasião de manifestar que o Senhor dera ao seu povo toda espécie de dons, regalias e proteção, e amparou-o de inúmeras formas. Porém, em determinado momento, vendo que não cuidava da vinha e se utilizava de todos os benefícios para o próprio interesse, e até contra Ele, confia ao seu Filho a missão de convertê-lo. Contudo, o delírio de tomar posse da herança do dono, a cobiça dos bens alheios, o desejo de apropriação e o ódio à superioridade levam os vinhateiros — os chefes da nação — a atentarem contra a vida de Nosso Senhor Jesus Cristo.
40 “Pois bem, quando o dono da vinha voltar, o que fará com esses vinhateiros?” 41 Os sumos sacerdotes e os anciãos do povo responderam: ‘Com certeza mandará matar de modo violento esses perversos e arrendará a vinha a outros vinhateiros, que lhe entregarão os frutos no tempo certo”.
Os presentes, acostumados ao hábito oriental de considerar a interpretação das parábolas como sinal de inteligência e cultura, estavam preocupados em decifrar com acerto as palavras do Divino Mestre, que vislumbravam dizer-lhes respeito. Por isso, sem pensar muito, deram uma rápida solução. Não compreenderam que “o Senhor lhes pergunta não porque ignore o que vão responder, mas para que se condenem com sua própria resposta”.6 O veredicto dos sumos sacerdotes e dos anciãos do povo era na verdade uma acusação, como tornam patente as posteriores palavras de Nosso Senhor. Como comenta São João Crisóstomo, “eles pronunciaram uma sentença contra si mesmos [...1. E, justamente, se [Jesus] lhes propôs uma parábola, foi porque queria que eles pronunciassem sua sentença. Foi o que aconteceu a Davi, quando ele próprio sentenciou na parábola do profeta Natã”.7
O Pai exaltará o Filho assassinado
42 Então Jesus lhes disse: “Vós nunca lestes nas Escrituras: ‘A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto foi feito pelo Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos?’ 43 Por isso, Eu vos digo: o Reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que produzirá frutos”.
Na construção das casas do tempo havia pedras postas nos ângulos para fixar e manter as demais, conferindo firmeza ao edifício. Para este fim eram usadas as de maiores dimensões, pois tinham a função de sustentar a construção, e, por suas características peculiares, às vezes não eram adequadas nas anteriores etapas da obra. Isto ocorria, sobretudo, no caso das pedras que rematavam as cúpulas. Ao usar esta figura como símbolo de Si mesmo, o Redentor mostra que o Filho, a quem eles recusaram e haveriam de matar, Deus O põe no mais alto patamar. E, aplicando a parábola diretamente a seus interlocutores, os adverte de que, por não terem dado os frutos que deveriam, serão desprezados, postos de lado e privados de seus privilégios, que serão transferidos a outros povos.
A parábola é lindíssima e tão clara — ao contrário de outras, à primeira vista misteriosas para o público — que nem sequer os Apóstolos ou aqueles a quem era dirigida pediram a Jesus sua explicação. Tais destinatários, ademais, receavam que Ele manifestasse de maneira ainda mais categórica a grave acusação que sobre eles pesava.
Deus castiga os indivíduos e os povos
A conclusão de Jesus deixa patente como o Senhor não só castiga em plano individual aqueles que, dando-Lhe as costas, abraçam as vias da perdição, mas chamará a juízo também as nações. Assim sendo, a parábola contém uma lição para o nosso tempo, pois parece evidente que Ele pode punir a humanidade. Hoje comprovamos que o relativismo, o materialismo, o egoísmo, a falta de virtude e de amor a Deus tomaram conta do mundo, o qual está pervadido por um espírito oposto ao d’Ele e se tornou como a vinha escolhida que não deu as uvas desejadas. É possível que essa videira receba a recompensa descrita na primeira leitura e no Evangelho.

Por tal motivo convém escutar, na segunda leitura (Fl 4, 6-9), a exortação de São Paulo na Epístola aos Filipenses: “ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso, tudo o que é virtude ou de qualquer modo mereça louvor” (4, 8). E a pureza de alma que falta a este mundo, onde se cometem pecados ovantes contra a castidade, são adotadas modas cada vez mais impudicas, presencia-se a dissolução familiar e o desaparecimento da virgindade. Tudo isso vai atraindo a indignação de Deus e, se não houver um surto de conversão que sustente o braço da cólera divina, ignoramos o que sobrevirá sobre nossa geração. Uma vez que Ele não tolera o pecado, quando intervirá? Não sabemos, mas devemos nos compenetrar pessoalmente da importância de praticar a virtude, seja em família ou na vida consagrada, com espírito de oração, fé e piedade, pedindo que o Senhor Se compadeça de nós e conceda graças especialíssimas para haver uma mudança no rumo dos acontecimentos. Só assim “a paz de Deus” (Fl 4, 7) estará conosco, e não a sua ira.
CONTINUA NO PRÓXIMO POST.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

EVANGELHO – XXVII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - Mt 21, 33-43

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – 27º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A
O Divino Mestre fala aos dirigentes de Israel
Naquele tempo, Jesus disse aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo: 33a “Escutai esta outra parábola: Certo proprietário plantou uma vinha, pôs uma cerca em volta, fez nela um lagar para esmagar as uvas, e construiu uma torre de guarda”.
Nesta parábola Jesus Se dirige às altas autoridades de Israel: os sumos sacerdotes e anciãos do povo, nata da sociedade daquele tempo e responsáveis por guiá-la. Todos eram homens letrados, profundos conhecedores da Escritura e, sem dúvida, ao iniciar o Mestre a narração, eles tinham presente a profecia e o Salmo que contemplamos hoje, e muitos outros textos sagrados, nos quais Israel é comparado a uma vinha (cf. Jr 2, 21; Ez 15, 1-6; 19, 10-14; Os 10, 1; Ct 2, 15; etc.).
Segundo a descrição de Nosso Senhor — harmônica com as referidas passagens do Antigo Testamento —, podemos imaginar o protagonista desta parábola como um varão de grande capacidade de trabalho e muitas posses, que despendeu cuidados extremos para cultivar sua vinha com a maior perfeição. Colocou-a “em fértil encosta” (Is 5, 1) iluminada pelo Sol, onde há arejamento e a água escorre, deixando a terra drenada, o que favorece a produção da uva. Isto significa que Deus deu ao povo eleito uma natureza privilegiada e condições propícias para receber o que há de mais valioso: a vida sobrenatural. Limpou convenientemente o terreno e cercou-o (cf. Is 5, 2a), ou seja, removeu da alma dos israelitas certas misérias que prejudicavam o desenvolvimento da graça e protegeu-os para impedir que outros lhes fizessem qualquer mal. Plantou ainda “videiras escolhidas” (Is 5, 2b), quis cumulá-los de dons extraordinários, tendo em vista que no seio desta nação estava sendo preparada a ascendência d’Aquele que seria o seu Filho Unigênito Encarnado e de sua Mãe, Maria Santíssima. Como diz São João Crisóstomo, “Ele nada omitiu no que dizia respeito à solicitude por eles”.2
Os arrendatórios da Vinha: novo e principal aspecto da parabola
33b Depois, arrendou-a a vinhateiros, e viajou para o estrangeiro”.
Naquele tempo, na Palestina, não era raro o aluguel de terrenos de plantio. Os arrendatários dividiam o lucro com o dono, pagando o que lhe correspondia conforme o contrato. Não nos esqueçamos de que o esforço para preparar a vinha tinha sido do segundo, o qual havia comprado a terra e montado toda a infraestrutura necessária para dela se tirar proveito.
O presente versículo nos oferece a peculiaridade desta parábola, considerando os demais textos do Antigo Testamento que tratam da vinha, pois não se centra na relação desta com o proprietário, e sim entre ele e os agricultores contratados. A vinha é Israel, o dono é Deus. Ele encarrega alguns de cultivá-la, e parte para longe, “para deixar os vinhateiros trabalharem aoseu livre-arbítrio”.3 Eis a realidade pungente e clara: Deus não parece habitar junto aos seus escolhidos nem convive com eles de forma visível, mas põe à sua frente homens notáveis chamados a governá-los, autoridades religiosas incumbidas de guiá-los no caminho da salvação. E “assim como o colono, ainda quando cumpre o seu dever, não agradará ao seu amo se não lhe entregar as rendas da vinha, assim também o sacerdote não agrada tanto ao Senhor por sua santidade, como ensinando ao povo de Deus a prática da virtude”.4 Deste modo, pelo contexto da parábola, o Divino Mestre evidencia a classe à qual era destinada.
Resumo da histórica infidelidade dos dirigentes do povo
34 “Quando chegou o tempo da colheita, o proprietário mandou seus empregados aos vinhateiros para receber seus frutos. 35 Os vinhateiros, porém, agarraram os empregados, espancaram a um, mataram a outro, e ao terceiro apedrejaram. 36 O proprietário mandou de novo outros empregados, em maior número do que os primeiros. Mas eles os trataram da mesma forma”.
Os empregados, mandados pelo senhor da vinha para receber os frutos, simbolizam os profetas enviados por Deus ao longo de toda a história de Israel para cobrar os lucros dos que deveriam reger a nação, de acordo com as determinações d’Ele. Não obstante, esses emissários foram perseguidos e mortos — como o próprio Jesus denunciou (cf. Mt 23, 30-31.37; Lc 11, 47-51) —, porque sua pregação contrariava as más inclinações reinantes e, sobretudo, os interesses dos dirigentes da sociedade. Sua presença tornava-se um estorvo que era preciso eliminar. São Jerônimo resume esta reprovável atitude: “golpearam-nos como a Jeremias (Jr 37, 15), mataram-nos como a Isaías (Hb 11, 37), lapidaram-nos como a Nabot (I Rs 21, 15) e a Zacarias, a quem mataram entre o Templo e o altar (TI Cr 24, 21)”. É a fúria do pecador contra aqueles que vêm lembrá-lo de que a propriedade do povo eleito pertence a Deus; fúria contra os que representam a Lei e o direito; fúria contra os que exigem o cumprimento da vontade do Senhor. “Por que esse terreno não é nosso?”, queixam-se. E, no fundo, uma inconformidade com a autoridade de Deus.
CONTINUA NO PRÓXIMO POST.